Escrever é injusto porque joga, invariavelmente, com as preferências de cada pessoa que lê. Há textos preferidos, há textos indiferentes – são estes o pior cenário para quem escreve.
Aquele que escreve confronta-se com a folha de papel branca à sua frente como se esta fosse a sua maior inimiga. O vazio da página é a promessa de perfeição a quem lê. A primeira palavra de cada texto olha para o escriba e pergunta se a segundo será tão incrível como ela, e assim consecutivamente. É injusto escrever porque nunca se escreverá perfeição. Escrever tem e terá sempre falhas. Pequenas fendas no mural branco escrevinhado a preto que a cada releitura aumentam de proporções até se tornarem autênticos buracos na parede.
Não gosto de reler o que escrevo. Gosto de escrever de uma assentada só. Por causa das falhas e fendas e buracos. Sei que a segunda leitura da primeira escrita será a maior injustiça à ideia que vem após o derradeiro ponto final.
Escrever é injusto porque nunca se vai escrever o que se quer como quer. Há apenas uma maior ou menor aproximação. Há, ainda, a injustiça de querer agradar a todos os leitores e saber que só alguns serão visados pela putativa beleza das palavras. Uma frase que tenha dado um trabalho hercúleo a ser construída pode ser destruída se lida com uma indiferença excruciante.
Escrever é a única arte que rejeita perfeição. E fá-lo por manifesta incapacidade de alguma vez atingir esse estatuto. Não pode, não quer, não consegue. No fundo, escrever é um acto de rebeldia. Quanto mais rebelde o escritor for, mais menos perfeito é o texto.